Eu li e é bom! - da semana


Texto escolhido por Silas Lima

Viver é muito bom.
Ricardo Gondim.



Viver é tão prazeroso que dá vontade de continuar, continuar. Sofro, como todo mundo, mas as minhas dores, decepções e frustrações ainda não foram fortes o suficiente para me desmotivar. Quando pareço zangado, minha veemência não nasce de amarguras, mas da inquietação espiritual de perceber que as coisas não caminham como deveriam.

Gosto de viver, ninguém se engane. Só não quero camuflar minhas dores “porque um líder religioso não pode expor suas inquietações publicamente”. Faço eco às palavras do Fernando Pessoa: “Arre, estou farto de semi-deuses!”. Quando escancarar os porões de minha alma, não desejo fazer tipo ou posar de “autêntico”. Faço “literatura tempestiva” (considero que sites e blogs como um novo tipo de literatura, a “tempestiva”) sem envernizar o texto, sem lapidar os conceitos e sem temer escrúpulos e censuras ideológicas. Sento diante do computador como terapia; quando escrevo, de certa maneira, lavo a alma, expulso falsos demônios e alvejo antigos dilemas encardidos.

Gosto de viver, só não quero acostumar-me com as desigualdades econômicas. Não aceito que um artista, atleta ou empresário ganhe mais do que uma nação inteira. Se pareço meio irritadiço é porque não acho que uma bolsa feminina custe o salário anual de um trabalhador. Uma xícara de café não pode valer mais do que um dia suado de um camponês. Por favor, não me peçam para continuar com o discurso pequeno burguês dos evangélicos brasileiros de que esses desmantelos fazem parte de um plano misterioso (maravilhoso?) de Deus que condena milhões de crianças a uma sub-existência.

Gosto de viver, só não quero satisfazer-me de chavões. Ficou provado que as minhas indagações não dizem respeito a uma multidão de crentes. Pelo contrário, eles se escandalizaram quando foram informados de minhas reflexões teológicas. Para uma montanha de teólogos, ousei mexer no que não devia; para a grande maioria dos crentes, cutuquei no vespeiro de assuntos que só deveriam nos interessar depois da morte - "Deus nos esclarecerá no céu". Mas eu comecei a ler alguns pensadores que me antecederam e senti uma enorme sintonia com suas meditações. Adorei ler a biografia da Simone Weil, os pensamentos do Abraham Heschel, as considerações do André Comte-Sponville, os conceitos pós-colonialistas do Juan Luis Segundo, a sensibilidade do Henri Nouwen; e na carona deles, comecei a pensar em voz alta. Se tais pensamentos são tão perniciosos que eu precise ser calado, lamento, porém não me intimidarei.

Gosto de viver, só não quero atrelar meu conceito de vida aos legalismos imbecis dos fariseus de plantão. Não vou deixar de apreciar a música do Chico Buarque, a literatura da Isabel Allende, a poesia do Fernando Pessoa ou o cinema do Almodóvar, porque alguns religiosos não toleram que “gente do mundo” seja inteligente e elegante na sua produção artística. Se os meus novos gostos fizeram de mim um enófilo esporádico e um poeta amador, não permitirei que me inibam com falsas culpas; sinto-me feliz.

Gosto de viver e estou disposto a degustar cada dia que me sobrar aqui na terra. Vou continuar correndo e me preparando para maratonas; vou continuar estudando ciências da religião e teologia; vou continuar lendo e citando meus autores prediletos. Não quero provocar e nem contender com ninguém, desejo, tão somente, cumprir o que o apóstolo Paulo recomendou: “Tudo o que vocês fizerem, quer comam quer bebam, façam para a glória de Deus”.



Soli Deo Gloria.



texto reportado de www.ricardogondim.com.br


Comentários

pena q nem todos possam dizer q compartilham dessa alegria

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